Alcionne e a casa

Bom... nova história, novos personagens. Alcionne ainda aparecerá nos blogs e a casa descrita teve inspiraçãoeu num sítio, em Rio das Flores, que pertencia a uma prima da mamãe ("Tia Déia"), mas a foto que usei é de outro local. Aproveito para deixar meus votos de Feliz Natal a todos. Vamos, então, continuar a história...
 
Alcionne era minha ajudante. Esqueci de falar dela! Quando me instalei nesta cidade, eu morava num pequeno quarto de uma pousada; não tinha carro e andava de charrete de aluguel (coisas de interior.) A cidade, ou quase isso, era uma mistura de estrada com casas pequenas, uma ou outra rua e um centro em torno de uma pracinha onde havia o comércio que era restrito a um banco, uma agência dos correios, uma padaria e uma ou outra loja. Ao menos sem fumaça e sem a visão do concreto armado das cidades grandes. Sempre fazia o mesmo trajeto e, numa casa mínima, em uma pequena travessa, eu observava rapidamente, uma senhora – Alcionne - de quem ninguém sabia grandes coisas. Intrigava-me observá-la de relance, em sua janela, parecia que esperava alguma coisa. Eu gostava de imaginar suas histórias, seu destino, seu passado (cacoete de escritora!). Diziam muitas coisas a seu respeito,  mas ninguém sabia ao certo quem fora e de onde viera. 
 
Um dia tudo mudou: fui interpelada por ela, ao saltar da charrete, que se apresentou para trabalhar, com a proposta de que eu comprasse uma “casinha” que ficava a dois quilômetros da entrada da cidade. Contou que já havia criado os filhos, era viúva, morava sozinha e não queria nem salário. 
 
Uma surpresa para mim! Difícil acreditar devido às características físicas. Evidente que não concordei com isso, mas ela disse que ficaria satisfeita com a minha companhia e com um canto onde ela pudesse guardar as suas coisas e dormir, escapando definitivamente da solidão. 
 
Levou-me, então, para ver a casa - que na verdade era um sítio - e acabou me convencendo a comprar. Dinheiro, felizmente, não era problema, pois eu ainda recebia muito pela venda de meus livros, e acabei fechando o negócio meio que enfeitiçada por este doce de candura que se chama Alcionne. 
 
Ela pediu também licença para plantar uma horta e um jardim para deixar a casa mais alegre (achava tudo muito triste a minha volta!) e disse que revitalizaria o pomar que fora abandonado pelo dono anterior. Então combinamos que ela cuidaria da pequena produção do sítio e o excedente – que era bastante, pois não dávamos conta de comer toda a produção - ela poderia vender e ficar com o dinheiro integralmente e, aí sim, ela concordou. Ainda bem, pois grávida, sem ninguém e na minha situação de tristeza, ela foi uma dádiva divina.
 
A casa era a maior da cidade. Fora de um fazendeiro que a deixara sua para os filhos e fora morar num sítio bem maior. A frente sugeria dois andares, mas o andar térreo era somente o local onde ele guardava a charrete. O terreno era inclinado e ele a construíra no final do terreno sobre pilotis. Havia uma escada de cimento com dois acessos e no meio deles um armário de ferramentas de jardinagem. Ao final da escada havia uma enorme varanda, com o piso de cimento avermelhado da mesma cor das lajotas que cobriam o muro, que contornava toda a frente e as laterais onde havia um acesso ao quintal no lado direito e no esquerdo havia uma grande janela que dava para a cozinha e que eu usava como sala de jantar nos dias quentes. Haviam bebedouros pendurados onde os beija-flores apareciam para se fartar da água açucarada cuidadosamente trocada, todos os dias, pela Alcionne. 
 
O interior da casa se abria em duas salas cheias de janelas que davam para a varanda. Eu mantive a decoração rústica com lamparinas por sobre a lareira de uma das salas assim como um berrante e um quadro aonde se via uma estrada muito longa cercada de árvores e uma charrete indo de encontro ao horizonte. Os quartos eram três de cada lado e eu usava o primeiro, a seguir da sala, e Carolina ficava no seguinte que era maior e mais fácil de montar sua casinha de bonecas e os outros brinquedos. Tentei convencer Alcionne a escolher um dos outros, mas ela preferiu ficar na casa que era do caseiro anterior onde, disse, ficaria mais a vontade porque roncava à noite. 
 
- Que visita, Alcionne! Ninguém vem me visitar.
- Mas é seu João que veio oferecer uns cavalos pra senhora...
 
(continua)
 
 
Eu sou doc

Comentários