Final da História ?

Na manhã seguinte Priti levantou-se como se nada tivesse acontecido. Era sábado e não haveria aula e nem festas. Apesar da recomendação da Alcionne, Priti foi lidar com o cavalo e resolveu ensinar Carolina a montar. Como ela não tinha medo, foi bem simples dar alguns passeios no quintal. O cavalo tornara-se muito manso e cuidadoso, coisa que até hoje ninguém entendeu.

- Oi mãe! Carol já consegue andar sozinha.
- Veja mãe! Ele faz o que eu mando. Priti me ensinou!
- Você só não falou como conseguiu controlar o cavalo.
- Hum! Lá vem você!
- Pelo visto o tempo que você passou fora fez você perder a confiança em mim!
- Claro que não mãe. É difícil contar tudo. A experiência foi muito intensa.
- Mas como você conseguiu?
- Com isso. – nisso ela mostra o cristal pendurado no seu cordão de ouro – é igual ao seu. Veio da mesma pedra. Em GAMA todos usam um cristal semelhante. Ele produz uma energia que só agora estamos conseguindo entender. Pode-se fazer coisas incríveis com ele. Sid acha que ele veio de um meteoro ou coisa do gênero. Impossível saber. Parecia uma jazida interminável.
- Mas como o meu veio da mesma pedra? Foi Elle, a mãe de Sid quem me mandou o cristal.
- Isso nós não sabemos. Mas foi por causa disso que eu te encontrei.
- Como assim?
- Entre outras coisas, podemos localizar pessoas que usam o cristal. Dentro deles existem uns filamentos prateados que fazem o cristal brilhar quando se tenta usar a energia.

Nisso eu comecei a entender algumas coisas. O cristal brilhava de vez em quando, pelo que dizia Alcionne, e eu só vi o brilho na noite do temporal e na manhã em que encontrara com Priti. Isso tudo era inacreditável. Achei melhor sentar. Estendi uma toalha de mesa no chão, peguei uma jarra de suco de laranja e ficamos ali conversando enquanto Carolina andava a cavalo.

- E foi assim que eu te achei depois que você desceu do jipe e começou a caminhar. – afirmou Priti com um largo sorriso nos lábios.
- Como é que é?
- Eu cheguei naquela noite de ônibus e saltei na estrada num momento em que o cristal brilhou mais forte e até assustou o motorista.
- Eu vi um ônibus passando...
- Aí comecei a caminhar até que o brilho do meu cristal se tornou muito forte e o seu cristal começou a brilhar. Corri na sua direção, mas você estava atônita e preferi somente te ajudar a chegar em casa e não falei nada. O cristal fez com que você dormisse tranquila e não lembrasse do acontecido.
- Mas por que você não falou comigo?
- Fiquei com medo da sua reação. Preferi esperar o amanhecer.
- E você dormiu ao relento?
- Alcionne me acomodou no quarto.
- Alcionne?
- Ela só dorme depois que você chega em casa, ou você não sabia disso?
- É mesmo! Mas ela me paga! Como é que ela nem me contou nada?
- Isso já é com vocês, né mãe?!
- Bom, mas o que aconteceu com Sid? Por que ele não voltou com você?
- Priti, quero descer. Me ajuda? – Carolina interrompeu a conversa num momento importante. Priti foi ajudá-la. Notei que ela também possuía um colar com o cristal. Priti levou o cavalo à estrebaria e não respondeu minha pergunta.
- Mãe, me empurra no balanço? – era a minha vez de distrair minha princesinha.
- Tá bom, Carol, mas só um pouquinho, ok?
- Tá.

Do pouquinho de balanço veio a hora de desenhar e ler histórias, o que tomou o restante do tempo da manhã. Priti ficou conosco e não tocamos mais no assunto. De qualquer maneira estava decidida a voltar a conversar com ela depois do almoço, quando Carolina estivesse dormindo.

Almoçamos e Priti mal tocou na sopa que Alcionne deixou preparada no fogão. Coloquei Carolina na cama, como de praxe e, quando voltei para a sala, Priti examinava um pacote.

- O que é isso, Priti?
- A pesquisa que pedi para Denise, a oceanóloga.
- Mas peraí? Ela saiu daqui ontem!
- Mãe, estamos em 2025, hoje em dia tudo se resolve rápido.
- Ah! Mas foi rápido demais.
- Ela explica no relatório que resolveu fazer tudo no laboratório do Museu de Ciências aqui da cidade. E eu pedi pressa.
- Por que tanta pressa?
- Porque não tenho tanto tempo.
- Mas Priti...

Priti empalideceu e novamente sentiu um mal estar.

- Filha, o que há com você?
- Nada mãe. Só estou feliz.
- Mas passando mal assim?
- Estou grávida, mãe. Você vai ser avó.
- Avó? Eu?
- É, né?
- Oh! Filha! – eu não sabia se ficava triste ou contente ou sei lá o que.
- Só que agora eu preciso descansar.
- Claro, claro. Quer um chá?
- Não! Só dormir.

Envolta em meus pensamentos, minha cabeça rodava. As horas passaram rápido. Carolina acordara, pedia muito minha presença e tentei me distrair contando histórias de quando Priti era pequena. Chegou a hora do jantar e Priti não se levantou. Dei o jantar à Carolina, coloquei pra dormir cedo (a muito custo) e fui ter com ela. A chuva era certa e já trovejava com o céu de início de noite sendo muitas vezes iluminado. Fui até o quarto. Bati de leve na porta e ela não atendeu. Resolvi entrar. A cama vazia. Uma carta era tudo que me esperava.

“Minha querida mãe!

A minha volta foi um misto de saudade e de necessidade. Sid foi ferido há algumas semanas por um peixe no lago dos suprimentos. Ele foi tirar uma criança que caíra na água foi atingido pelo ferrão. O cristal tem muitos poderes e sua energia evita que tenhamos doenças, mas nunca o usamos para curar ninguém. Tive que voltar para tentar a cura. Era a única esperança. No tempo normal, Sid já deve ter morrido, mas tentarei voltar com o antídoto para o momento do acidente. Não sei se vou conseguir, mas tentarei.

Eu te amo. Diga pra Carolina que eu a amo também.

Priti”

Ao lado da carta de Priti estava o relatório de Denise.

“Querida Priti!

Apesar de você ser muito misteriosa sua ansiedade me fez descobrir rápido a origem do veneno do ferrão. O laboratório do Museu de Ciências é fantástico e fiz contato com o Butantã e descobri que o veneno é de uma espécie de arraia variante do niquim (Thalassophryne nattereri é o peixe venenoso que mais causa acidentes no Brasil.). O niquim existe no Brasil principalmente em Alagoas só que seu veneno não é mortal ao contrário do que você me trouxe. Como a base é a mesma, concluímos tratar-se de uma evolução do peixe. Desde 1996 que o Butantã estuda o niquim e existe um antídoto experimental que estou te enviando. Testei em alguns animais com o veneno do ferrão que você trouxe e deu certo. Boa sorte. Denise”.

Minha vida desabara de novo. Novamente coisas inacreditáveis me cercavam. Viagens no tempo, curas milagrosas com cristais e novamente perdera minha filha mais velha. Adoeci e pedi uma licença na escola. Carolina ficou desolada com a situação e não saia do meu lado. Alcionne chamou o médico que receitou uns medicamentos que eu tomava a muito custo.

- Ah! Alcionne! Detesto remédios.
- Mas a senhora tem que ficar boa pra cuidar de seus netos.
- Que netos, Alcionne! Carolina ainda é muito pequena. E Priti foi embora e cuidará deles sozinha.

De qualquer maneira, depois de uns dois dias a febre cedeu e retomei minhas atividades em casa. Carolina ficou mais animada e me contava histórias que aprendera na escola. Daí pra frente, nunca mais tive notícias. A vida continuou e...
 
(continua?)
 
 
Eu sou doc

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